SÃO LUIS – Mais uma vez, trago a reflexão sobre a necessidade de uma REFORMA DO SISTEMA POLÍTICO-PARTIDÁRIO-ELEITORAL no Estado Democrático de Direito. Na verdade, de uma Reforma Política que altere estruturalmente o sistema de grandes desigualdades, em que a força do dinheiro e das empresas é que define os eleitos no jogo da democracia dos políticos. Do contrário, “os donos” dos partidos políticos vão sempre ter o protagonismo maior nas escolhas da lista dos nomes de candidatos/as, e o povo, mero coadjuvante, torna-se protagonista somente no momento de votar, e, na maioria das vezes, capturado pelo poder econômico e de quem tem condição de atender às suas necessidades.
Em seu clássico “Sociologia dos Partidos Políticos” (1917), Robert Michels (sociólogo alemão) aponta que “não se concebe a democracia sem organização”. Ele também não deixou de afirmar que “representar significa fazer aceitar, como sendo vontade da massa, o que não passa de vontade individual […]. Mas uma representação permanente equivaleria sempre a uma hegemonia dos representantes sobre os representados”.
Quando Michels se refere ao funcionamento dos partidos políticos, então, é mais brilhante (ele que era um desencantado com a falta de democracia interna nos partidos). E, ao analisar na sua principal tese, a “lei de ferro da oligarquização” focada nos sindicatos e partidos operários, afirma: “os partidos políticos cada vez mais vão se transformar em uma oligarquia (de poucos)”. Nada mais atual do que essa análise.
No Brasil, segundo informação no site do Tribunal Superior Eleitoral (2022), há 32 partidos com registro oficial. O partido União Brasil é a fusão do DEM, de Antônio Carlos Magalhães Neto, e o PSL, de Luciano Caldas Bivar. Não vejo como problema a quantidade de partidos, mas a questão é a sua falta de democracia interna e obscura, a falta de transparência (no tocante ao financiamento público de campanha) e o seu débil funcionamento. Muitos não têm programa e concepção, sequer, projeto; atuando como empresas, dirigidos por poucos (em sua maioria), como analisou Michels: verdadeira oligarquia — às vezes uma autocracia liderada por outsider ou por aqueles que se consideram donos.
No período da Redemocratização e do Constitucionalismo (promulgação da Constituição de 1988), com o fim do golpe militar, quando ocorreu a primeira eleição direta, o presidente da República eleito foi o ex-deputado federal e ex-governador de Alagoas Fernando Collor de Mello, do nanico PRN. Nessa eleição do ano de 1989, a disputa foi de 22 partidos com seus candidatos na corrida de presidente da República: Collor de Mello (PRN), Lula (PT — que disputou sua primeira eleição e tendo como vice Bisol do PSB, e foi para 2º turno com Collor), Leonel Brizola (PDT, terceiro colocado), Mário Covas (PSDB, quarto colocado), Paulo Maluf (PDS, quinto). Partidos dos demais candidatos: PL, PMDB, PCB, PFL, PSD, PTB, PRONA, PSP, PP, PCN, PN, PLP, PV, PMN, PPB, PDCdoB e PMB.
Dos 22 partidos políticos que estiveram na disputa da eleição de 1989, somente seis — PT, PL, PDT, PSDB, PCB e MDB — podem ter candidaturas próprias a presidente da República em 2022.
O feito histórico é que Lula conseguiu se manter como a maior liderança popular ativa na luta política do Brasil, mesmo tendo sido preso no golpe militar e no período dito “democrático”. E lembremos que o Partido dos Trabalhadores não ficou fora de nenhuma disputa de presidente da República desde a redemocratização. São 33 anos ativos na democracia dos políticos.
Aqui, um novo personagem que entra na disputa de presidente do Brasil, em 2018, é o ex-deputado federal Jair Bolsonaro (28 anos de mandato na Câmara), que já foi filiado aos partidos PDC, PPR, PTB, PFL, PP, PSC e PSL, e por este último partido disputou a eleição e foi eleito, naquele ano, quando polarizou a eleição com Fernando Haddad (PT). Depois, desfiliou-se do PSL ficando sem filiação partidária (2019-2021). No final de 2021, filiou-se ao PL, o partido que vai disputar a reeleição em mais uma polarização com o PT, só que agora com Lula. No Maranhão: a atuação dos partidos políticos
Paridos dos governadores do Maranhão do período de 1966-2022 – 1 foi pelo UDN, 4 da ARENA, 2 do PDS, 4 do PMDB, 7 do PFL, 1 do PDT, 1 PCdoB e 1 do PSB. E aqui, partidos que protagonizam a cena política por um logo período no Maranhão — UDN, PDS, ARENA, PFL e PMDB. Foram partidos dos grandes coronéis oligárquicos e que, agora, alguns já extintos e outro, no caso, o P-MDB, apresenta-se fragmentado e com reduzida força e certa dificuldade para formar chapa forte e competitiva na disputa eleitoral — o que já aconteceu na eleição de 2020. Outro partido que também enfrenta dificuldade é o PSDB, que já polarizou várias eleições, com o PT e Lula. Note-se que vem perdendo a sua identidade nacional como partido forte que já elegeu, por dois mandatos, o Presidente da República do Brasil, no caso, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso, e vem governando, por um longo período, o rico estado de SP, mas está reduzido à sua pequenez no Maranhão. O PT de Lula, mesmo mantendo muita força na disputa nacional, ainda é, no Maranhão, um partido que não apresenta muita força eleitoral.
Dos nomes tradicionais da oligarquia maranhense que estão colocados para disputar eleição em 2022, temos: Roseana Sarney (do MDB, filha do ex-presidente José Sarney, governadora de 4 mandatos, que agora vai disputar uma vaga de deputada federal), Ricardo Murad (filiado ao nanico PSC, cunhado de Roseana, ex-presidente da Assembleia Legislativa, que vai disputar uma vaga de deputado estadual), Edison Lobão Filho (do MDB, filho de Edison Lobão, ex-governador, foi senador e ministro de minas e energia do governo Lula, que vai disputar uma vaga de deputado federal pelo MDB), Adriano Sarney (do PV, neto de José Sarney, filho do ex-deputado federal Sarney Filho, ex-ministro de Meio Ambiente no governo de FHC, que vai disputar a reeleição de deputado estadual, pela federação PT/PCdoB/PV). Disso tudo, há que se afirmar que o pós-Flávio Dino não significa o retorno da oligarquia-familiar.
Outro dado importante é que o agora fragmentado grupo Sarney está apoiando diversas pré-candidaturas ao governado do Maranhão: o atual governador Carlos Brandão (PSB), o senador Werverton Rocha (PDT), o ex-prefeito de São Luís Edivaldo Holanda (PSD), Lahesio Bonfim (do partido AGIR, antigo PTC, ex-prefeito do pequeno município de São Pedro dos Crentes, no Maranhão, cidade no estado em que Bolsonaro obteve sua maior votação em 2018).
Nesse sentido, defendo que uma reforma política de verdade não seja centralizada, via Congresso Nacional (certo corporativismo) e com reduzida participação da sociedade civil, favorecendo, assim, os grandes partidos e um modelo de partido dominado por um pequeno grupo (uma pequena elite da classe política) de forma oligárquica “de poucos”, interferindo numa democracia partidária. Portanto deve ser proposta uma norma legislativa que obrigue votações internas nos partidos, entre seus filiados e membros, de forma transparente, até com observadores externos. Deveria haver uma legislação bem-fundamentada em relação à própria democracia partidária, até em relação às votações, representatividade, e que, infelizmente, ainda não aconteceu. Também deveria garantir as representações de segmentos, como indígenas, negros, mulheres, juventude, GLBTQI+, respeitando a sociedade pluriétnica que é o Brasil. Penso que esse deve ser um debate central na defesa de uma verdadeira reforma política para alterar a estrutura de funcionamento dos partidos como organização fundamental para uma dada democracia, com participação popular e não só de “elite” ou de políticos profissionais.
Por fim, o desafio é se continuar lutando por democracia nos partidos, seja de concepção de esquerda, centro ou de direita, considerando que é no partido político onde se inicia o processo de escolha dos representantes em que a sociedade posteriormente terá que votar. E tal debate ainda não aconteceu de fato, para se ter uma reforma política. Todavia nota-se que parte grande da sociedade já vem demonstrando desinteresse, desencanto e descrédito com o processo partidário e eleitoral, vide o aumento no percentual de abstenções, voto branco e nulo. Por isso é um tema estratégico.
Por Sílvio Bembem
Doutor em Ciências Sociais-Política (PUC-SP). Professor e Servidor Público.
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