BRASÍLIA – Na noite de quarta-feira (18), o Senado aprovou o projeto (PL 4.932/2024) que proíbe a utilização de celulares por alunos em sala de aula das escolas públicas e particulares do país. O texto, que diz respeito à educação básica (ensinos infantil, fundamental e médio), já havia passado pela Câmara dos Deputados e agora segue para a sanção do presidente Lula.
O projeto de lei indica que aparelhos eletrônicos portáteis não podem ser utilizados durante a aula, o recreio ou intervalos entre as aulas. Na regulamentação da lei, após ser sancionada, deverá ser definido o modo como os aparelhos serão acondicionados de acordo com a capacidade de cada escola. A ideia é definir se haverá algum lugar indicado para o armazenamento, ou se os estudantes deverão deixar os equipamentos guardados e desligados dentro de suas mochilas enquanto estiverem no ambiente escolar.
Apesar da restrição, há excepcionalidades. De acordo com o texto, na sala de aula o uso de aparelhos eletrônicos poderá ser permitido “para fins estritamente pedagógicos ou didáticos, conforme orientação dos profissionais de educação”.
Também existe a flexibilização para o uso dos celulares em sala de aula quando a utilização atender a critérios de acessibilidade, inclusão, condições de saúde dos estudantes ou garantir direitos fundamentais.
Além de restringir o uso, as escolas deverão elaborar estratégias para tratar do tema do sofrimento psíquico e da saúde mental dos estudantes da educação básica, informando-lhes sobre os riscos, os sinais e a prevenção a este mal em crianças e adolescentes, incluídos o uso imoderado dos aparelhos eletrônicos portáteis pessoais, inclusive telefones celulares, e o acesso a conteúdos impróprios.
Nas redes sociais o ministro da Educação, Camilo Santana, comemorou a aprovação: “É uma vitória do Brasil, dos nossos jovens, fruto da sensibilidade do nosso Congresso, que tratou com celeridade esse tema tão importante.”
Repercussão
O Portal Vermelho procurou ouvir dois lados sobre o tema: professores e estudantes. Na visão da educadora Valéria Morato, que é presidenta do Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro Minas) e da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB/MG), a necessidade em se fazer uma lei para regular a utilização do celular, por si só, já demonstra o total desregramento da utilização.
Ela ressalta que o uso indiscriminado dos celulares tem trazido riscos aos estudantes e que a lei não afasta totalmente o uso dos equipamentos, sendo que podem ser utilizados para fins pedagógicos.
“No caso, não se trata de abolir o instrumento, a lei deixa bem claro que a utilização para fins pedagógicos é conveniente. A escola é o lugar onde se elaboram regras de socialização e o aprendizado se dá de forma dialógica. A utilização do celular de forma indiscriminada faz com que os estudantes fiquem cada vez mais isolados dessas convivências presenciais. E a elaboração da maturidade e do respeito às regras de convivência se dá através dessa interação com seus pares”, explica.
“O Brasil viveu uma onda de ‘condenação’ da escola como espaço de aprendizado, sendo considerado até como espaço de balbúrdia, e de tratamento dos professores e professoras como “doutrinadores”. E os celulares em sala de aula foram utilizados, inúmeras vezes, como “arma” para gravações e edições a bel prazer do proprietário. Como não temos, ainda, uma regulação das redes sociais, não foram poucos estudantes e docentes que foram vítimas de fake news. Por isso, entendo que a lei vem como contribuição nesse momento”, completa Valéria Morato, ao deixar em aberto a possibilidade de que a lei seja aperfeiçoada à medida que o Brasil avance em regramentos para a utilização e proteção dos cidadãos em ambientes digitais, assim como ocorra maior valorização dos profissionais de educação e do ambiente escolar como um todo.
Já em sentido crítico ao projeto, o estudante e presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Hugo Silva, reforça a nota publicada no site da entidade, na qual a restrição dos celulares é vista com preocupação, uma vez que pode acentuar desigualdades. A entidade pede um debate mais aprofundado sobre o uso de celulares nas escolas e sobre como transformar as escolas em ambientes mais tecnológicos.
“Muitas escolas não possuem nem internet, muito menos laboratórios de informática. Para muitos alunos, o celular é a única ferramenta disponível para acessar a internet e recursos educacionais. Proibir o uso de celulares sem garantir a construção de escolas mais tecnológicas é reforçar essa desigualdade. Além de entreter os estudantes, os celulares funcionam como uma ponte para o acesso à educação em dinâmicas dentro da sala de aula”, aponta Silva.
A Ubes utiliza uma pesquisa da Pew Research Center em que 77% dos professores acreditam que dispositivos móveis podem melhorar o aprendizado, promovendo engajamento e facilitando o acesso a informações.
“Em vez de adotar uma proibição simples e direta, é fundamental que o debate sobre o uso de celulares nas escolas seja acompanhado de uma discussão sobre como transformar as escolas em ambientes mais tecnológicos. O uso de celulares pode ser regulado, com limites adequados durante as aulas e um incentivo ao seu uso pedagógico em atividades que exigem ferramentas digitais. Proibir por proibir sem oferecer alternativas tecnológicas adequadas apenas acentuará as desigualdades no sistema educacional público”, afirma o presidente da Ubes.