MANAUS – “Compramos 320 mil cestas básicas de alimentação e, em São Gabriel da Cachoeira, as cestas já chegaram para as comunidades indígenas, permitindo que os índios permaneçam confortáveis em suas aldeias nesse período de pandemia”, disse a ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), no sábado (6), via nota à imprensa.
Até agora, porém, nenhuma família recebeu a ajuda no município de 45 mil habitantes, um dos mais impactados pela Covid-19 na Amazônia e com cerca de 90% de população indígena.
“Nas nossas aldeias aqui em São Gabriel da Cachoeira não recebemos nenhum alimento do governo federal”, afirma Adão Henrique Baré, diretor da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn).
A entidade, que reúne 700 comunidades de 23 povos indígenas espalhados por três municípios da calha do Rio Negro, divulgou uma nota de repúdio contra Damares na qual cobra informações sobre a distribuição das cestas.
“O único apoio que recebemos do governo federal até hoje foi entrega de medicamentos, itens de higiene e máscaras, mas tudo em quantidade muito menor do que precisamos. Continua faltando de tudo”, declarou a liderança.
Via ofício, o Ministério Público Federal no Amazonas deu um prazo de 72 horas para que o Ministério da Cidadania explique a declaração de Damares e quais as medidas já foram adotadas pela sua pasta na região.
São Gabriel registrou os primeiros casos do coronavírus em 26 de abril. Desde então, a epidemia se espalhou por todo o município, de tamanho comparável à Inglaterra. Até terça (9), foram 2.342 casos e 29 óbitos, segundo a Secretaria de Saúde do governo do Amazonas.
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa de Damares informou que houve um erro na redação da declaração, divulgada pelo Ministério da Defesa. Segundo a pasta, as cestas básicas já estão em São Gabriel e serão distribuídas na semana que vem pela região, conhecida como Cabeça do Cachorro e de forte presença militar por estar nas fronteiras com Colômbia e Venezuela.
No sábado, Damares acompanhou, em Brasília, o embarque de cerca de duas toneladas de equipamentos médicos na aeronave KC-390, o maior cargueiro da Força Aérea Brasileira, para a área de São Gabriel da Cachoeira. Trata-se de uma ação conjunta dos Ministérios da Saúde e da Defesa.
O presidente da Foirn, Marivelton Baré, criticou a morosidade do governo. “Temos comunidades inteiras infectadas pela Covid-19, algumas já passaram pelo pico da doença, mas em outras está apenas iniciando. Faltam testes rápidos, medicamentos e profissionais de saúde nas comunidades. Hoje, os indígenas são médicos de si próprios, e a medicina tradicional é o único tratamento que temos disponível em muitas localidades”, afirmou.
Questionado se o auxílio está chegando com atraso devido à proliferação acelerada do vírus na região, o Ministério da Cidadania não respondeu.
Segundo balanço de segunda da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), foram confirmados 2.642 casos de Covid-19 em 75 povos, com o registro de 218 óbitos.
Os dados são compilados pela Coiab com base em boletins informativos e notas de falecimento da Secretaria de Saúde indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, além de informações de lideranças, de profissionais de saúde indígena e de organizações.
O número de casos confirmados de Covid-19 entre indígenas divulgado pela Coiab é 74% maior do que o dado oficial da Sesai, que só contabiliza mortes de moradores de terras indígenas. O número de óbitos entre os indígenas, segundo a Coiab, é 207% maior que o informado pelo governo federal.
BNC Brasil