GRANDE ILHA – Quando a ponta do iceberg é tão devastadora quanto a parte que não se consegue ver é possível perceber que a situação é bem pior do que se imagina. Dados alarmantes de uma pesquisa realizada no Hospital Universitário da UFMA (HU-UFMA), vinculado à Ebserh, revelam que o Maranhão é líder em casos de câncer de pênis no Brasil e no mundo.
A pesquisa foi realizada por um grupo formado por 12 pesquisadores, 11 do Maranhão e uma de São Paulo, divididos entre profissionais, acadêmicos e pós-graduandos. O trabalho utilizou dados de três hospitais de São Luís: Hospital Universitário da UFMA, Hospital Aldenora Belo e Hospital Geral Tarquinio Lopes Filho e foi feito com base em registros de 2004 a 2014 de cada uma dessas instituições referentes aos prontuários e laudos das biopsias. Em uma faixa-etária entre homens de 18 e maiores de 80 anos, foram detectados 392 casos de câncer de pênis. Destes, mais de 90% estão associados com o HPV.
Baseado na pesquisa, o artigo científico “Penile cancer in Maranhão, Northeast Brazil: the highest incidence globally?”, publicado recentemente na conceituada revista internacional BMC Urology, determina a incidência mínima de câncer de pênis e descreve as características epidemiológicas e clínicas dos pacientes diagnosticados com a doença no estado do Maranhão.
Um dos autores da pesquisa, Gyl Eanes Barros Silva, patologista renal e chefe do Laboratório de Imunofluorescência e Microscopia Eletrônica (LIME) do HU-UFMA, explica o que significa essa incidência mínima. “São Luís é uma cidade geograficamente isolada do resto do estado. Uma grande parte da população do Maranhão vai buscar tratamento em Teresina, Belém, Tocantins, entre outros. Ou seja, a incidência real é bem maior, mas só podemos usar o que temos registrado aqui, que já representa um número significativo. Por isso reforço que isso é só a ponta do iceberg”.
O pesquisador relata outro ponto importante em relação a esses dados. “Os pacientes estão chegando 2,4 anos após o início dos sintomas. Esperar tudo isso para buscar tratamento, significa morte. Mais de 98% dos casos vão a óbito. A falta de informação e o baixo índice sócio-econômico contribuem muito para isso dificultando o acompanhamento adequado e a conclusão do tratamento também”, reforça.
Entretanto, o câncer de pênis associado com o HPV possibilita uma chance de interveção por parte do poder público, como destaca o patologista. “Podemos acabar ou pelo menos diminuir, caso sejam tomadas medidas preventivas, a exemplo da vacina contra o HPV. Por isso, a importância que os resultados dessa pesquisa alcancem um grande número de pessoas. A prevenção é a chave para reverter esse quadro alarmante. O HPV é o grande causador, a fimose e a falta de higiene é um fator a mais, que muito contribui também”.
De acordo com o Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), o Maranhão aparece como o líder no mundo em casos de câncer de pênis, com 6.1 por cada 100 mil habitantes. Logo atrás está Gioânia com 3.3. Gyl Eanes reforça que o número do segundo lugar está superestimado, uma vez que foi feito em cima dos dados da cidade e não do estado, se fosse pelo estado seria ainda menor, evidenciando a diferença entre o resultado do Maranhão e os demais.
Câncer de pênis
O câncer de pênis é uma neoplasia rara nos países desenvolvidos. No entanto, a incidência nos países em desenvolvimento da Ásia, África e América Latina é alta, sendo responsável por até 10% das neoplasias malignas em homens. No Brasil, a condição pode responder por 2,1% de todas as neoplasias em homens e afeta principalmente os habitantes das regiões Norte e Nordeste. Entre os fatores de risco conhecidos para o desenvolvimento do câncer de pênis, a falta de higiene, fimose, infecção pelo papilomavírus humano (HPV), uso de tabaco e comportamento sexual de risco são os mais destacados.
Autores da Pesquisa
Ronald Wagner Pereira Coelho, Jaqueline Diniz Pinho, Janise Silva Moreno, Dimitrius Vidal e Oliveira
Sobre a Ebserh
Desde janeiro de 2013, o HU-UFMA é filiado à Ebserh, estatal vinculada ao Ministério da Educação que administra atualmente 40 hospitais universitários federais. O objetivo é, em parceria com as universidades, aperfeiçoar os serviços de atendimento à população, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), e promover o ensino e a pesquisa nas unidades filiadas.
O órgão, criado em dezembro de 2011, também é responsável pela gestão do Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (Rehuf), que contempla ações nas 50 unidades existentes no país, incluindo as não filiadas à Ebserh.
BNC Cidades