BRASÍLIA – A Polícia Federal realiza uma ampla apuração sobre emendas parlamentares apresentadas por 92 políticos com mandato atual ou anterior no Congresso Nacional, para decidir se pedirá ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de novos inquéritos que investiguem possíveis crimes como corrupção, peculato e prevaricação.
Enquanto isso, cidades e entidades beneficiadas pelos recursos correm para regularizar suas prestações de contas e evitar que a falta de informações sobre o uso das verbas resulte em investigações policiais.
A análise da PF começou em setembro, por determinação do ministro Flávio Dino, com base em uma nota técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre emendas individuais apresentadas entre 2020 e 2024.
Segundo o TCU, até 1º de setembro, havia 148 emendas, somando R$ 85 milhões, sem plano de trabalho cadastrado na plataforma federal responsável pelo controle dessas transferências — um documento que passou a ser obrigatório por decisão do STF.
Essas emendas foram apresentadas por parlamentares de 15 estados, com destaque para o Amazonas, que concentra R$ 27 milhões desse total.
Determinação do ministro Flávio Dino
Com base nos dados do TCU, Dino ordenou que a PF abrisse inquéritos estaduais para investigar possíveis crimes como prevaricação, desobediência a ordem judicial, emprego irregular de verbas públicas, peculato e corrupção.
O ministro ressaltou que os inquéritos tramitarão inicialmente no STF, “em razão da possível conexão com atos parlamentares, o que exige cautela para preservar as prerrogativas dos congressistas”.
Desde então, a PF analisa os casos mencionados na nota técnica, concentrando-se inicialmente nas entidades e municípios beneficiários, mas sem descartar que as apurações cheguem a deputados e senadores que destinaram as emendas.
A corporação também avalia agrupar investigações envolvendo o mesmo parlamentar ou o mesmo município, a fim de otimizar o trabalho. Os casos que se tornarem inquéritos devem se somar a outros 80 processos semelhantes já em curso no STF sobre desvios de emendas parlamentares.
Casos em destaque
De acordo com o TCU, o ex-deputado Bosco Saraiva (Solidariedade-AM) foi o político que mais destinou recursos com pendências. Ele direcionou R$ 7,9 milhões em emendas para os municípios de Maués, Itamarati e Santo Antônio do Içá. Atualmente, Saraiva é superintendente da Zona Franca de Manaus e não é investigado.
Apenas Santo Antônio do Içá justificou o uso dos recursos, informando que a verba de R$ 1,5 milhão seria usada para comprar uma embarcação de apoio às atividades educacionais nas comunidades ribeirinhas.
Procurado, Bosco Saraiva afirmou que, ao ser informado das pendências, entrou em contato com as prefeituras para que regularizassem a situação. “Recebi a informação de que as providências estão sendo tomadas”, disse.
As prefeituras de Maués e Itamarati não responderam.
Estados mais afetados
O estado com o maior número de emendas sob apuração é São Paulo, com 39 emendas somando R$ 14,7 milhões sem plano de trabalho. Em seguida vêm Amazonas (23), Bahia (22), Maranhão (14) e Minas Gerais (11).
Tensão entre Congresso e STF
O aumento das investigações sobre emendas parlamentares no Supremo tem sido motivo de tensão entre o Congresso e o Judiciário. Desde que Flávio Dino assumiu o gabinete e passou a priorizar o tema, os inquéritos cresceram significativamente.
Por decisão do STF, a liberação de recursos via emendas agora só ocorre mediante apresentação de plano de trabalho detalhado, o que atingiu principalmente as chamadas “emendas Pix” — transferências especiais criadas para agilizar repasses, mas que apresentam falhas de transparência e rastreabilidade.
Dino também informou que deve submeter ao plenário do STF o julgamento do mérito das ações que discutem a constitucionalidade das emendas parlamentares. Para isso, solicitou manifestações da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Procuradoria-Geral da República (PGR).
BNC Política
