BRASÍLIA – A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (9) o texto-base da proposta de revogação de toda a legislação eleitoral ordinária, substituindo-a por um único código, com 898 artigos. Foram 378 votos a favor e 80 contra.
Esse é o principal projeto do pacote eleitoral liderado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e relatado por uma de suas principais aliadas, Margarete Coelho (PP-PI).
Entre as várias modificações debatidas a toque de caixa pelos deputados e previstas no texto-base estão a censura a pesquisas eleitorais e a fragilização de normas de transparência, fiscalização e punição de políticos e partidos por mau uso das verbas públicas.
Há ainda a proposta de manietar o poder da Justiça Eleitoral de regulamentar as eleições.
A quarentena eleitoral de cinco anos a juízes, membros do Ministério Público, militares e policiais que queiram disputar eleições -e que entraria em vigor somente a partir de 2026- acabou não tendo voto suficiente para se manter.
Essa parte foi suprimida durante a votação das emendas -no caso dos juízes, foram 254 deputados a favor da medida, mas eram necessários ao menos 257.
A Câmara tem nas últimas semanas votado propostas que visam alterar praticamente toda a legislação eleitoral e política do país, em uma reforma que, se entrar em vigor, será a maior da história desde a Constituição de 1988.
Parte do pacote já foi derrotado, como a impressão do voto dado pelo eleitor na urna eletrônica e a instituição do chamado “distritão”, um novo modelo para eleição de deputados e vereadores.
A retomada da possibilidade de coligações nas eleições para deputados e vereadores, além de amarras ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), já foram aprovadas pela Câmara e estão sob análise do Senado.
Entenda os principais pontos de cada uma das sete frentes de debate no Congresso, o estágio da tramitação de cada uma delas e o que pode mudar em relação ao que vigora hoje em dia.
1 – REVOGAÇÃO DE TODA A LEGISLAÇÃO ELEITORAL ORDINÁRIA E CONSOLIDAÇÃO DAS REGRAS EM UM ÚNICO CÓDIGO
O que é: projeto de lei complementar relatado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), uma das principais aliadas de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara.
Estágio de tramitação: texto-base aprovado nesta quinta (9)
Próximos passos: caso seja aprovado, segue para votação no Senado. Para valer nas eleições de 2022, tem que estar aprovado e sancionado pelo presidente da República até o início de outubro, a um ano da disputa
Alguns dos principais pontos:
Pesquisas eleitorais
Como é: Podem ser divulgadas inclusive no dia da eleição
Como ficaria: Só podem ser divulgadas até a antevéspera da eleição. Além disso, é preciso publicar um percentual de acertos das pesquisas feitas nas últimas cinco eleições
Cotas de gênero e racial
Como é: Partidos precisam distribuir as verbas públicas de campanha proporcionalmente aos candidatos homens e mulheres, negros e brancos
Como ficaria: Texto original estabelecia que mulheres poderiam usar cota em benefício de candidatos, e não fazia menção a cota racial. Já o texto protocolado para votação prevê a distribuição de verbas de forma proporcional a homens e mulheres, negros e brancos, além de trazer algumas inovações. Uma delas estabelece que o voto dado na mulher contará em dobro para o cálculo de distrituição das verbas públicas aos partidos
Fundo Partidário
Como é: Lei estabelece restrição ao uso do cerca de R$ 1 bilhão distribuído anualmente às siglas
Como ficaria: Partidos têm ampla autonomia para usar a verba de acordo com suas conveniências, inclusive para pagar multas eleitorais
Prestação de contas
Como é: Justiça analisa a prestação de contas de partidos e candidatos, aplicando punições e determinando devolução de recursos em casos de irregularidades. Prazo para análise das contas partidárias é de até 5 anos
Como ficaria: A análise deverá se restringir ao cumprimento de regras burocráticas. Sistema de prestação de contas é desmantelado. O prazo para análise cai de cinco para dois anos, o que eleva a chance de prescrição. A multa por desaprovação das contas partidárias não poderá ultrapassar o valor de R$ 30 mil. Devolução de verbas só ocorrerá em caso de gravidade
Cassação de mandatos
Como é: Políticos podem perder os mandatos caso sejam condenados por crimes como o de compra de voto
Como ficaria: Para que haja cassação, terá que ser provado que o candidato usou de algum meio violento para coagir o eleitor
Lei da Ficha Limpa
Como é: Pune com inelegibilidade políticos condenados na Justiça por órgão colegiado, que tiveram o mandato cassado ou renunciaram para escapar à cassação
Como ficaria: Diminui os prazos de inelegibilidade
Crimes eleitorais
Como é: Transporte irregular de eleitores, boca de urna e comício no dia da eleição são crimes
Como ficaria: Passam a ser apenas infração cível, punida com multa
Resoluções do TSE
Como é: Tribunal pode editar resoluções sobre as eleições e responder a consultas dos partidos a qualquer tempo
Como ficaria: Para valer nas eleições, essas resoluções terão que ser emitidas com antecedência mínima de 1 ano. O Congresso passa também a ter o poder de cassar resoluções do TSE
Caixa dois eleitoral
Como é: Não há tipificação específica para o crime de movimentar recursos de campanha sem informar à Justiça
Como ficaria: Passa a ser crime específico, com pena máxima passível de acordo de não persecução penal
Quarentena eleitoral
Como é: Não há
Como ficaria: Texto original criava quarentena de 5 anos para que militares, juízes e membros do Ministério Público pudessem disputar eleições. Regra valeria só a partir de 2026. Deputados rejeitaram a medida na votação em plenário
Mandatos coletivos e relação entre partidos e movimentos de renovação na política
Como é: Não há regulamentação
Como ficaria: Regulamenta o mandato coletivo. Sobre a relação entre partidos e grupos de renovação na política, deixa explícita a autonomia partidária em relação a esses grupos
Propagação de fake news nas eleições
Como é: Crime, com pena de detenção de dois meses a um ano ou pagamento de multa
Como ficaria: Pena é elevada para 1 a 4 anos, sendo acrescida de metade a dois terços se visa atingir a integridade dos processos de votação, apuração e totalização de votos, com a finalidade de promover a desordem ou estimular a recusa social dos resultados eleitorais
2 – ALTERAÇÕES NAS REGRAS ELEITORAIS ESTABELECIDAS NA CONSTITUIÇÃO
O que é: proposta de emenda à Constituição relatada pela deputada Renata Abreu (Podemos-SP)
Estágio de tramitação: aprovado na Câmara
Próximos passos: Em tramitação no Senado. Tem que ser aprovada e promulgada até o início de outubro para valer nas eleições de 2022
Alguns dos principais pontos e o que já foi analisado:
Distritão: plenário da Câmara dos Deputados rejeitou a criação do modelo de eleição de deputados e vereadores, pelo qual ganham as vagas os mais votados
Aprovação da volta das coligações: a medida foi fruto de um acordo entre os defensores do distritão, que não tinham os 308 votos necessários para mudar o sistema eleitoral, e a oposição, que afirmou entender a volta das coligações como um “mal menor”.
O fim das coligações para a eleição ao Legislativo foi uma das medidas mais elogiadas dos últimos anos. Partidos nanicos tendem a obter vagas no Legislativo apenas em coligações com siglas maiores. A proibição dessas alianças começou a valer na eleição municipal de 2020.
3 – VOTO IMPRESSO
O que é: proposta de emenda à Constituição relatada pelo deputado Filipe Barros (PSL-PR)
Estágio de tramitação: arquivado
Votação: derrotada em plenário em 10 de agosto. Faltaram 79 votos para que a PEC fosse aprovada. Foram 229 a favor do texto, 218 contra e uma abstenção. Eram necessários ao menos 308 votos. Comissão especial sobre o tema já tinha rejeitado a proposta uma semana antes, mas o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu levar o projeto ao plenário.
Principal ponto:
Pretendia estabelecer a impressão do voto dado pelo eleitor na urna eletrônica. O projeto obrigava a expedição de cédulas físicas conferíveis pelo eleitor, que seriam depositadas em uma urna, de forma automática e sem contato manual
4 – MINIRREFORMA ELEITORAL DO SENADO
O que é: projetos sobre temas eleitorais, já aprovados pelo Senado
Estágio de tramitação: aguardam votação pela Câmara
Próximos passos: caso sejam aprovados pelos deputados sem alteração, vão à sanção presidencial. Caso sejam alterados, voltam para análise do Senado. Para valer nas eleições de 2022, têm que estar sancionados até o início de outubro, a um ano da disputa
Alguns dos principais pontos:
Cotas de gênero e raça
Como é: Partidos precisam distribuir as verbas públicas de campanha proporcionalmente aos candidatos homens e mulheres, negros e brancos
Como ficaria: Anistia todos os partidos que não cumpriram as cotas de gênero e racial nas eleições realizadas ate agora
Cota de candidaturas femininas
Como é: Partidos precisam lançar ao menos 30% de candidatas
Como ficaria: Estabelece cota de cadeiras femininas nos Legislativos (18% em 2022, chegando a 30% em 2038), mas retira a exigência de que os partidos lancem ao menos 30% de candidatas
Partidos nanicos
Como é: Mesmo que não atinjam um patamar mínimo de votos (quociente eleitoal), eles podem participar da disputa das chamadas sobras, que são as cadeiras residuais no Legislativo não ocupadas na primeira distribuição
Como ficaria: Só participarão da disputa das sobras caso atinjam o quociente eleitoral (número de votos válidos dividido pelo número de cadeiras)
5 – FUNDO ELEITORAL
O que é: previsão de gasto de dinheiro público na campanha de 2022, inserida na Lei de Diretrizes Orçamentárias
Estágio de tramitação: Aprovado pelo Congresso, foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro
Próximos passos: independentemente da decisão de Bolsonaro agora, valor final só será definido na discussão pelo Congresso do Orçamento-2022, a partir de setembro
Principal ponto:
Deputados e senadores aprovaram a LDO com dispositivo que quase triplica o valor do Fundo Eleitoral para as eleições de 2022, indo para R$ 5,7 bilhões. O fundo é a principal fonte de financiamento dos candidatos. Há tentativa de acordo para que o valor fique em torno de R$ 4 bilhões. Bolsonaro vetou os R$ 5,7 bilhões, mas Congresso pode ou derrubar o veto ou definir o valor no final do ano, na discussão do Orçamento da União para 2022.
6 – SEMIPRESIDENCIALISMO
O que é: texto ainda indefinido
Estágio de tramitação: nova proposta de emenda à Constituição pode ser apresentada ou pode ser usado texto já protocolado no ano passado pelo deputado Samuel Moreira (PSDB-SP)
Próximos passos: medida precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado em dois turnos de votação em cada Casa, com o apoio de ao menos 60% dos parlamentares.
Principal ponto:
Espécie de parlamentarismo, mas com a manutenção de mais poder na mão do presidente. O presidente da República, eleito pelo voto direto, é o chefe de Estado, comandante Supremo das Forças Armadas e tem o poder de dissolver o Congresso Nacional em casos extremos, convocando novas eleições, entre outras funções. Ele é responsável por indicar o primeiro-ministro, que é quem governará, de fato, juntamente com o Conselho de Ministros. O gabinete cai e é substituído caso perca apoio no Congresso.
O modelo é defendido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes e pelo ex-presidente Michel Temer (MDB). O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), manifestou inclinação favorável à medida, para valer a partir de 2026. Oposição no Congresso é contra.
7 – FEDERAÇÕES PARTIDÁRIAS
O que é: permite a partidos se unirem em federação para escapar da punição da cláusula de desempenho, que retira recursos de siglas com baixíssima votação nas urnas
Estágio de tramitação: aprovado no dia 12.ago pela Câmara
Próximos passos: como já tinha sido aprovada pelo Senado, medida seguiu para sanção ou veto do presidente Jair Bolsonaro. Ele disse que irá vetar a proposta. Mesma medida consta do projeto relatado pela deputada Margarete Coelho.
Com informações da folhaexprexx
BNC Política